Com o término do governo de Jair Bolsonaro (PL), que se prepara para dar lugar ao terceiro governo de Lula (PT), o legado econômico que fica de herança para a futura gestão petista tem sido a pauta do momento no que tange à transição de governo. De um lado, os petistas alegam que vão herdar uma “herança maldita” pelos próximos anos, enquanto que a atual pasta da economia garante que o cenário é de contas públicas equilibradas e com dinheiro em caixa.
Mas, afinal, sem as paixões que envolvem as narrativas políticas de um lado e de outro, qual é o real cenário por trás da economia do país ao fim do governo Bolsonaro? É possível dizer que houve avanços, embora algumas expectativas não tenham sido supridas. Antes de uma abordagem sobre outros números, a queda no desemprego merece um destaque especial.
Queda expressiva no desemprego
Apesar da pandemia da Covid-19, que forçou a adoção de medidas de restrição que impactaram a economia e causaram demissões, sobretudo no setor hoteleiro, gastronômico, de turismo e outros, a evidente queda do desemprego, pode-se dizer, é um legado da equipe gerenciada pelo ministro da economia, Paulo Guedes. Quando Bolsonaro assumiu o governo, em 2019, o desemprego no país beirava a casa dos 12%, em meio a uma onda de insatisfação econômica causada pela instabilidade no Mercado de Trabalho.
Mas de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego caiu para 8,3% no último trimestre de 2022, no fim do governo de direita, sendo o menor nível desde o ano de 2015, após sucessivos meses com saldo positivo na criação de vagas de trabalho. Com isso, foram cerca de 5 milhões de vagas de empregos criadas desde 2019.
Para o economista paraibano Werton Oliveira, esse avanço é significativo. “O Brasil é um dos países no mundo em que houve um avanço significativo, saindo de dois dígitos, da casa de 13%, e caindo para a casa de 8%. Foi um avanço impressionante, mas é importante olharmos para a frente. Se mantermos essa taxa ou reduzirmos um pouco mais no próximo ano, será ótimo”, avaliou.
Ponto de vista fiscal: Estado menos endividado
Do ponto de vista fiscal, a economia também melhorou, já que a gestão federal, sob Bolsonaro, termina com uma dívida menor do que quando o governo teve início, em 2019. Apesar da implementação de gastos extraordinários de quase R$ 700 bilhões para o combate à pandemia, que representaram 10% do PIB, a equipe econômica deverá entregar as contas públicas a Lula em situação melhor do que recebeu, em 2019.
A Dívida Bruta deve terminar o ano representando 74% do Produto Interno Bruto (PIB), em nível inferior à dívida de 2018, de 75,3%. O governo Bolsonaro também deve findar com superávit primário de R$ 23,4 bilhões, o primeiro na gestão federal desde 2013, quando Dilma Rousseff era presidente.
Para o economista Werton Oliveira, esse não é um resultado que cabe apenas à equipe econômica. “Esse fato é importante, mas isso não é mérito somente da equipe econômica, pois tem a ver com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e o Teto de Gastos, implantado no Governo Temer, o que forçou o controle de gastos. Com a melhora da economia, tivemos melhora nas arrecadações e fecharemos o ano com uma dívida/PIB abaixo de 75%”, ressaltou.
Liberdade econômica: avanço discreto
De viés liberal, o ministro Paulo Guedes conseguiu imprimir sua marca na economia, mas os especialistas esperavam mais do que algumas medidas pontuais. “Essa agenda andou, mas andou a passos curtos, digamos assim, e esperamos que os próximos governos melhorem esse aspecto que é importante para o crescimento do país”, disse Oliveira.
O avanço, mesmo que tímido, representou certa redução do Estado na economia, como a reforma da Previdência, a autonomia do Banco Central, a privatização da Eletrobras, a venda de participações de estatais em empresas privadas, o corte de impostos e diversas medidas microeconômicas. Por outro lado, avanços esperados, como a Reforma Tributária e a Reforma Administrativa, ficaram pelo caminho.
Inflação melhor, mas num patamar ainda indesejado
Apesar da pandemia do novo coronavírus ter ceifado a vida de quase 700 mil brasileiros e jogado a inflação mundial para as nuvens, desorganizando as finanças públicas e a economia, provocando a falta de produtos e o aumento no processo dos combustíveis, tornando mais cara a qualidade de vida, o cenário é de inflação num patamar melhor do que o contexto parecia indicar.
O país registrou períodos de deflação em 2022, após a desoneração sobre combustíveis proposta pelo Governo Federal e aprovada pelo Congresso Nacional. Os números mais recentes indicam que o índice deve ficar na casa de 5,8% ao fim do governo Bolsonaro, o que ainda é um número acima da meta do Banco Central, de 2 a 5%.
“A inflação tem sido a grande vilã da economia brasileira nos últimos anos. Conseguimos controlar o índice por causa da desoneração dos combustíveis, mas voltamos a ter um resultado positivo. Diria que conseguimos contornar melhor a inflação nesse ano, mas novamente vamos estourar a meta, como foi no ano passado”, avaliou o Werton, que prevê ainda um aumento no índice para o ano que vem em decorrência da PEC da Transição, que prevê aumento de gastos para 2023.
Afinal, qual o balanço da gestão Bolsonaro-Guedes na economia?
Publicado na última quarta-feira (14), um editorial do Estadão resumiu o legado de Paulo Guedes na economia durante a gestão Bolsonaro: “ao analisar a questão de um ponto de vista objetivo, com base nos números e nas realizações efetivas de Guedes durante os quatro anos em que comandou a economia, ele implementou ou apoiou uma série de medidas liberalizantes e tudo indica que deverá entregar o posto com as contas públicas sob controle e os principais indicadores apontando uma melhora na economia”.
Apesar dos reveses e da frustração em termos de reformas (como a administrativa e a tributária), que não saíram do papel, é possível dizer que Paulo Guedes deixa uma herança positiva no que tange ao liberalismo econômico e às contas do governo, mas os avanços poderiam ter sido maiores sem os ruídos políticos e desentendimento entre Poderes que acompanharam o governo nos últimos 4 anos.
Os olhos, agora, se voltam para a futura equipe da economia, a ser comandada pelo futuro ministro Fernando Haddad. “A futura equipe me deixa um pouco assustado, porque parece que o Governo Lula 3 parece muito com o Governo Dilma (marcado pela gastança em detrimento da responsabilidade fiscal)”, finalizou Werton Oliveira.
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