As diretrizes para o programa do PT surpreenderam negativamente. Confirmaram declarações recentes do ex-presidente, principalmente sobre a revogação do teto de gastos e da reforma trabalhista. Repisaram ideias que fracassaram, como a de expandir despesas públicas que promoveriam o crescimento e, em seguida, elevariam a receita, compensando o aumento dos gastos e do endividamento do Tesouro. Haja equívoco!
Antes, Lula recorreu a um raciocínio torto. Para ele, em vez de falar em “responsabilidade fiscal para garantir dinheiro a banqueiro, nós temos de discutir responsabilidade social para pagar a dívida com o povo trabalhador”. Por aí, não se deveria pagar a dívida pública. As diretrizes foram criticadas por analistas da economia e por editoriais de jornais, mas a declaração sobre a dívida passou em branco.
Ao insinuar o calote, ele cometeu erro comum entre os que atribuem aos bancos o papel de financiadores únicos do governo federal. Na verdade, segundo o Tesouro Nacional, em março último eles representavam 29,5% do total. Assim, mais de 70% vêm de fundos de investimento, fundos de pensão, entidades de previdência privada, investidores externos e outros grupos, inclusive pessoas físicas que aplicam no Tesouro Direto.
O calote atingiria, portanto, brasileiros que pouparam para sua aposentadoria e investiram seus recursos no mercado financeiro. Alcançaria também estrangeiros que acreditaram nas instituições e na seriedade do governo, bem assim parcela expressiva dos eleitores de Lula. Ele mesmo, provavelmente, tem parte de seus recursos aplicada em títulos públicos, ainda que não o perceba.
Em 2003, após eleger-se, Lula desprezou visões erradas. Abandonou ideias equivocadas do programa do PT e deu continuidade à política econômica de seu antecessor. Os correspondentes ganhos de confiança preservaram a estabilidade macroeconômica e contribuíram decisivamente para o sucesso de seu governo.
Ainda é cedo para que essas promessas populistas se reflitam nos ativos financeiros. Até aqui, boa parte do mercado financeiro parece acreditar que o ex-presidente, caso vitorioso, se guiará pela sensatez econômica, como o fez em 2003. Não se sabe, todavia, até que ponto essa paciência resistirá aos disparates de Lula. Aos poucos, os agentes econômicos podem ligar as “diretrizes” aos desastrosos erros de administrações petistas.
Uma boa fonte pode ser o livro Para Não Esquecer: Políticas Públicas que Empobrecem o Brasil, organizado por Marcos Mendes, que aborda equívocos das últimas décadas. Em análise da obra, Edmar Bacha mostrou que as medidas implantadas e as que tiveram continuidade nos governos do PT respondem por 80% dos erros apontados no livro.
Lula precisa preparar-se melhor para abordar temas econômicos que parece não dominar. Se essas ideias forem postas em prática, causarão danos imensos. Como dizia o conselheiro Acácio, as consequências virão depois. Não serão boas para o país nem para seu eventual governo.
Por Mailson da Nóbrega, economista paraibano, ex-ministro da Fazenda.
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