COPA DO MUNDO: a utilização do futebol como instrumento político no Mundial

Publicado por: Felipe Nunes em

Copa do Mundo e política andaram lado a lado ao longo do tempo / Créditos: Agenda Política / MarceloJr

Faltam poucas horas para o início da edição de 2022 da Copa do Mundo, um dos maiores e mais aguardados eventos esportivos do planeta, realizado a cada quatro anos. O estádio Al Bayt será palco da tradicional cerimônia de abertura do Mundial, neste domingo (20), pouco antes do duelo entre Qatar, anfitrião, e Equador.

Mais do que uma mistura de arte futebolística, com 32 seleções, haverá também uma diversidade de línguas, culturas e diferentes visões políticas reverenciando a bola. Cosmovisões antagônicas, inclusive. E para quem acha que futebol e política não se misturam, essa não é uma realidade quando se olha para a linha do tempo do futebol.

Na Copa de 2022, inclusive, há riscos de manifestações, por parte de entidades, jogadores e seleções, contra restrições de Direitos Humanos no país-sede, o que não deixa de ser um movimento com grande potencial de repercussão política no mundo inteiro. Por outro lado, os anfitriões esperam passar ao mundo uma visão de grandeza e organização.

No caso do Brasil, o Mundial sempre coincide com as eleições presidenciais, o que para comentaristas políticos pode atrapalhar ou ajudar os governantes de plantão, com suas políticas econômicas e sociais, ou contribuir positivamente ou negativamente, dependendo do resultado, com o governo que assumirá no ano seguinte.

A seleção brasileira foi pentacampeã em 2022, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), mesmo ano em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito pela primeira vez para governar o país.

Já em 2022, o Brasil tentará mais uma vez alcançar o tão aguardado hexa, no governo de Jair Bolsonaro (PL), e novamente no ano em que Lula é eleito presidente.

Futebol e política de mãos dadas

Ao longo da história,  o futebol e a Copa do Mundo foram utilizados de forma intrínseca e direta, como instrumento político, em ocasiões específicas. Como lembra o cronista Esportivo Stefano Wanderley, essa utilização, inclusive, ocorreu para o fortalecimento de regimes ou governantes que não eram democráticos.

A segunda edição da Copa do Mundo, por exemplo, realizada na Itália em 1934, serviu como subterfúgio para o ditador Benito Mussolini fomentar e fortalecer seu regime fascista através da seleção italiana, compelida por ele a vencer a competição esportiva. A única opção do regime era a vitória.

“Desde de 1934, da segunda edição da Copa do Mundo, que há essa ligação política. Mussolini recebeu os jogadores antes do mundial, sediado na Itália, e exigiu, ordenou que eles ganhassem a competição, e que caso contrário, tinha até ameaçado a delegação Italiana. Mas a seleção conseguiu ganhar a Copa e Mussolini saiu-se como um dos grandes personagens da época”, lembrou. (ASSISTA A SEGUIR)

Copa de 1970 – Brasil tricampeão mundial

Esse fenômeno também foi percebido no Brasil, na época da Ditadura Militar, mais precisamente na Copa de 1970, sediada no México. A seleção brasileira foi tricampeã mundial em um período de controle excessivo do regime brasileiro, que inclusive teria influenciado os rumos do time verde e amarelo.

A seleção brasileira tricampeã foi comandada por Mário Jorge Lobo Zagallo, que havia sido campeão como jogador em 1958 e 1962. Antes dele, porém, o time começou a ser montado por João Saldanha, ligado ao espectro político de esquerda e que acabou demitido meses antes da competição.

Na visão de alguns especialistas, a demissão teria sido causada por influência da Ditadura. Wanderley concorda com essa tese. “Ele era considerado um rebelde, e dizia o que muitos que não gostariam de ouvir”, conta. “E apesar do Brasil vivenciar a ditadura durante a Copa do México, houve as comemorações, houve a criação do que foi considerado o mais belo hino da seleção brasileira, Pra Frente Brasil”, destacou.

Copa de 1990 – futebol na democracia

Na Copa de 1990, sediada na Itália novamente, o toque da política esteve presente. O primeiro presidente eleito do Brasil após a redemocratização, Fernando Collor de Melo, chegou a visitar a seleção brasileira no país sede, misturando-se com os jogadores.

No dia 10 de junho de 1990, o então presidente Collor estava nas arquibancadas do estádio Delle Alpi, em Turim, quando a seleção brasileira derrotou a Suécia por 2 a 1 em sua estréia na Copa.

De acordo com reportagem da época, da Folha de São Paulo, o chefe da nação havia sido convidado pelo comitê organizador do torneio, tendo assistido à partida acompanhado da mulher Rosane, dos filhos Arnon e Joaquim Pedro, além de uma comitiva formada por seis assessores.

Ao final da partida, o presidente, que foi comentarista de um jornal durante o Mundial, disse que a vitória brasileira calou os críticos do trabalho do treinador da época, Sebastião Lazaroni. A seleção venceu a partida com dois gols do atacante Careca.

Collor chegou a participar de um treino da seleção, conta Stefano Wanderley. “Ele chegou a bater um pênalti para o Taffaréu, mostrando essa mescla do futebol com a política”, lembra. A seleção acabou eliminada depois, pela Argentina, nas oitavas-de-final, na sua pior campanha em Copas desde 1966.

Copa de 1994 – ápice do Plano Real

Em 1994, quando o Brasil foi Tetracampeão, ganhando a Copa do Mundo após 24 anos, o presidente da República era Itamar Franco. No ano seguinte após a vitória, Fernando Henrique Cardoso, embalado muito mais pelo sucesso do Plano Real do que pelos gols de Romário, chegou à Presidência da República, eleito pelo voto popular.

“O Brasil estava vivenciando o ápice do Plano Real, após a redomocratização, e eu vivi a época, porque tinha 15 anos. O Brasil estava em glória por ter derrubado a inflação. Isso foi justamente na Copa do Mundo, no período em que veio à tona o Plano Real”, relembra o cronista.

Em 2002, no pentacampeonato, FHC viu o jogador Vampeta, um dos campeões, dar cambalhotas na rampa do Planalto. Momento simbólico para um presidente em fim de mandato.

Copa de 2022 – a política se sobressai sobre o futebol?

Em 2022, a seleção brasileira vai para a Copa do Mundo no Qatar, em busca do hexa, mas o país está dividido, mergulhado no rescaldo da eleição mais polarizada da história, entre Jair Bolsonaro e Lula. Faltando um dia para a Copa, não é possível enxergar o sentimento de unidade popular de outros Mundiais, em que as ruas e as famílias estavam todas mobilizadas pelo sonho da Taça.

Uma curiosidade desse fenômeno, é que nem mesmo o nome dos jogadores da seleção brasileira, em sua maioria, são conhecidos do público, com exceção de alguns poucos, como Neymar, Thiago Silva, Daniel Alves, Lucas Paquetá e Alisson Becker. Isso, em parte, em razão da política.

É um momento completamente diferente dos tempos áureos da seleção. Nada que se compare à sintonia do torcedor com nomes como Pelé, Romário, Rivelino, Dunga, Ronaldo ou Ronaldinho, que se tornaram ídolos de suas gerações.

“Antes a gente via as ruas pintadas, os balões verdes e amarelos nas casas, nos shoppings, e hoje o assunto é só um, a eleição presidencial. O assunto no Brasil ainda é política, mais do que o futebol propriamente dito. Não sabemos à escalação da seleção, mas sabemos quem são os onze ministros do STF”, pontuou Wanderley.

Agenda Política

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