Paredes, prédios públicos e corredores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) são alvos constantes de pichações e vandalismos. É o que dizem estudantes e frequentadores de diferentes centros de ensino do campus I da instituição, no bairro do Castelo Branco, em João Pessoa. O fenômeno provoca nítida poluição visual e degradação do ambiente de uma das mais importantes instituições acadêmicas do país.
De acordo com imagens compartilhadas com o blog, e confirmadas pela reportagem in loco, as pichações vão desde mensagens com teor ideológico, xingamentos até riscos aleatórios e incompreensíveis. (ASSISTA AO VÍDEO LOGO ABAIXO). Na maioria dos casos, compromete a pintura do ambiente, que apesar de ter sido recuperado em algum momento, voltou a sofrer com o problema.
Muito embora seja considerada uma forma de protesto por alguns de seus praticantes, uma maneira de reivindicar algum direito ou demanda, a pichação é crime, de acordo com o ordenamento jurídico do país, nos termos do artigo 65 da Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), que estabelece pena de detenção de 03 meses a 01 ano, e multa, para quem pichar ou por qualquer meio conspurcar edificação ou monumento urbano.
Um dos pontos mais atingidos pelas pichações, no âmbito acadêmico, é o Centro de Comunicação, Turismo e Artes (CCTA), onde a poluição é degradante. Em quase todos os corredores do local há riscos, frases com teor ideológico e sexual e mensagens que denotam a polarização política do país. “Lula, cadê a maconha?”, diz uma das frases.
Outro trecho mostra o que seria uma “disputa” entre os pichadores: “Lula, Ladrão”, diz uma das frases, enquanto outra mensagem fala: “Bolsonarismo mata”, e ainda outra: “Fora tudo”. Além das frases políticas, há diversas “manifestações” incompreensivas, que tomam conta de algumas paredes, desfigurando totalmente o que seria um ambiente de aprendizado.
“Para mim o impacto visual que as pixações fazem é terrível. Passa um aspecto de sujo, de anarquia, de que não existem regras e de que o patrimônio público não é respeitado. Isso é ruim. Isso é desmotivante”, disse um estudante do Centro ao blog.
“Existem algumas obras de arte, isso é verdade. É bacana, mas chamar tudo aquilo de arte não é correto. Você vai ver palavrões, xingamentos a políticos, e isso divide ainda mais as pessoas. Causa um impacto visual negativo e a pessoa se sente intimidada. Pra mim é muito ruim”, acrescentou.
Na Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, também é possível ver pichações com teor político e sexual, além de protestos contra o aumento de passagens (o que é uma reivindicação legítima dos estudantes). Na visão de acadêmicos que discordam das pichações, no entanto, o protesto perde a coerência quando o patrimônio público é alvo de danos como os vistos em uma das praças do local.
Na Central de Aulas, o nome do atual reitor da instituição, Valdiney Gouveia, aparece em pichações como “Fora Valdiney, Maricona”. Por ter sido o menos votado da lista tríplice na última eleição para a Reitoria, ele tem sido alvo de críticas desde que foi nomeado, em 2020. Novamente, uma crítica democrática, mas que se desfigura na forma como é feita, na avaliação de alguns estudantes.
Outra imagem mostra que, num dos auditórios utilizados para importantes reuniões, colóquios e congressos acadêmicos, na Central de Aulas, há uma frase como “Fora Fascista”, em letras garrafais. São apenas alguns exemplos de cenas que se repetem por todo o ambiente acadêmico.
Em outros ambientes da universidade também há espaços para o grafite, que diferente da pichação, é uma manifestação artística autorizada, organizada, e que ao invés de poluir o ambiente, provoca reflexões e críticas sociais. Essas manifestações, no entanto, estão se tornando cada vez mais raras em relação à poluição e à degradação do picho.
“Isso me deixa triste. Os corredores de lá não transparecem com um ambiente acadêmico em que se possa estudar com paz mental e de espírito. A gente já chega com um peso inconsciente que se materializa em nosso estado de espírito”, diz outro estudante ao blog.
Para o advogado criminalista Diego Cazé, é preciso ampliar o debate sobre o pixo, sem que haja uma declaração de “guerra”, mas sim uma ação em que haja mais diálogo com quem o pratica. Ele lembra que, atualmente, o Poder Legislativo discute o endurecimento da lei contra a prática.
“É preciso criar critérios objetivos na lei e aumentar o espaço de diálogo entre poder público e a comunidade, para garantir essa livre manifestação, claro, sem deteriorar o patrimônio, que é de todos. E quando houver excessos, que eles sejam punidos, de acordo com a lei”, disse.
Procurada, a direção do CCTA informou, por nota, que está elaborando uma campanha, a ser feita com a comunidade acadêmica local, sobre a importância de cuidar dos prédios públicos.
Confira a nota a seguir.
“A Direção do CCTA está elaborando uma campanha de conscientização sobre a importância de se cuidar do que é público. É uma ação que vai envolver toda a comunidade universitária do Centro e também quem visita nossos espaços. O conteúdo está sendo feito com a participação de estudantes de comunicação e será divulgado em breve. Em 2020, os prédios do CCTA passaram por uma revitalização da pintura externa e interna. Esse trabalho foi feito nos Blocos A, B, C, D, no prédio dos Centros Acadêmicos, na Escola de Música, no Cine Aruanda e na Sala de Concertos Radegundis Feitosa. Por sermos um Centro que envolve cursos na área de artes, inclusive Artes Visuais, este ano iremos realizar um concurso com o objetivo de readequarmos o uso dos espaços. Será uma oportunidade para que artistas do CCTA possam realizar pinturas de forma organizada, proporcionando uma nova identidade visual ao nosso Centro”.
O Centro Acadêmico Vladimir Herzog classificou as pichações como “intervenções” e “expressões artísticas da comunidade acadêmica”. Leia a seguir. BAIXE AQUI O ARQUIVO DA NOTA DE ESCLARECIMENTO
“A respeito das últimas manifestações artísticas observadas nas paredes do Centro de Comunicação Turismo e Artes (CCTA) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o Centro Acadêmico de Jornalismo Vladimir Herzog (CAVH) esclarece alguns pontos importantes.
As supostas ‘pichações’ que têm sido alvo de preocupações não devem ser compreendidas como atos de vandalismo ou depredação do patrimônio público.
O CAVH considera essas intervenções nas paredes do CCTA como expressões artísticas da comunidade acadêmica. O ambiente acadêmico deve ser um espaço fértil para a livre expressão e o debate de ideias. As manifestações artísticas transcendem o mero ato de pichar e assumem um caráter de resistência, crítica social e política.
Essas expressões buscam chamar a atenção para questões importantes da nossa sociedade e provocar reflexões sobre problemas e desafios enfrentados por diferentes grupos sociais. É fundamental que a comunidade acadêmica e a sociedade em geral compreendam o valor dessas artes como formas de expressão e contribuições ao ambiente de aprendizagem.
Por fim, ressaltamos a importância do diálogo e da compreensão mútua a fim de encontrar soluções que conciliem a preservação da arte, do patrimônio e a manutenção de um ambiente cultural rico em expressões. O CAVH reafirma seu compromisso com a defesa da liberdade de expressão e com a promoção de um ambiente plural, que estimula o pensamento crítico e a criatividade.
Atenciosamente,
Centro Acadêmico de Jornalismo Vladimir Herzog”
Procurado, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) disse que o tema “demanda uma consulta pública a comunidade” e por isso não se pronunciou oficialmente.
Em resposta ao blog, a reitoria da UFPB se posicionou contra e condenou as pichações. Leia nota a seguir.
“A Universidade Federal da Paraíba (UFPB) não merece o desrespeito de vândalos, que deterioram o patrimônio público com pichações e fixação de cartazes em paredes e pilares da instituição, diversos expressando crimes de injúrias, calúnias e difamações, flagrantes ofensas às pessoas e à comunidade como um todo, num claro manifesto de ódio. Investimentos que poderiam ser destinados a ações finalísticas da Universidade (i.e., ensino, pesquisa e extensão) e promover a assistência estudantil se convertem em gastos para recuperar pinturas de fachadas das edificações. Todos somos responsáveis por esse bem público e a denúncia em canais oficiais (e.g., ouvidoria, Polícia Federal), motivando a responsabilização dos fora da lei, precisa ser a prática dos que amam a UFPB e zelam pelo bem público. Nada justifica essas ações criminosas dos vândalos, que não podem ser percebidos como membros da comunidade universitária, mas seus inimigos mais ferozes, que apenas cumprem seus interesses pessoais e de seus coletivos imediatos. Portanto, repudiamos veementemente as condutas dessas pessoas”.
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