As ações adotadas pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nos seis primeiros meses do seu terceiro mandato, apontam para uma série de contradições políticas, administrativas e éticas em relação ao discurso adotado por ele na campanha contra Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022. Um dos temas preferidos do petista nos embates contra seu adversário, era o meio ambiente.
Depois de eleito, entretanto, o discurso de que resgataria a agenda ambiental do Brasil, com olhar voltado à proteção das florestas, à sustentabilidade e à transição energética, parece que ficou no passado. O que se tem visto, na verdade, são decisões que não só contrariam o discurso petista como apontam para um retorno ao passado, uma visão do século XX.
Não discuto aqui o mérito das ideias de Marina Silva, do meio ambiente, mas elas foram fortemente defendidas por Lula enquanto era candidato. Na semana passada, entretanto, petistas apoiaram e comemoraram, na Comissão Mista, a aprovação da Medida Provisória que muda o desenho da Esplanada dos Ministérios e esvazia a pasta da atual ministra.
Segundo o texto, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) agora estará vinculado ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Os sistemas de saneamento básico, resíduos sólidos e recursos hídricos vão para o Ministério das Cidades e a A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) será vinculada ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.
Ainda conforme o texto aprovado, o Ministério da Justiça e Segurança Pública voltará a responder pelo reconhecimento e pela demarcação de terras indígenas, atribuições que haviam sido delegadas ao Ministério dos Povos Indígenas, criado em janeiro por Lula.
Pasmem! Tudo foi aprovado com o aval de petistas, que chegaram a comemorar o feito nas redes sociais. Coube à oposição fazer a defesa de Marina Silva no Senado. O deputado Kim Kataguiri (União-SP) declarou posição contrária às alterações no Ministério do Meio Ambiente. “Esvaziar o ministério é uma questão institucional, e essas mudanças serão prejudiciais, mesmo que eu discorde veementemente da ministra”, explicou.
Boicote
O boicote ao meio ambiente, entretanto, não parou por aí. Depois de acusar o opositor de ser negligente com a pauta ambiental, e de interferência em órgãos técnicos do governo, Lula tem dado sinais dúbios sobre o parecer técnico do Ibama contra a exploração de petróleo na Amazônia.
Até acho, particularmente, que o Governo Federal deveria dar o aval à empresa estatal para tal exploração, em nome do desenvolvimento nacional, garantindo a preservação do ecossistema local.
Mas para Lula essa não seria uma equação tão simples de resolver? Bastaria fazer a defesa de sua ministra do meio ambiente, impedir a exploração e dizer: eu assino embaixo do parecer técnico do Ibama. Não vai ter exploração na Amazônia!
Carros populares
Na última semana, mais uma medida do Governo Federal deu sinais de que o atraso ronda o Palácio do Planalto. Enquanto o mundo todo discute a transição energética e o desenvolvimento de novas tecnologias para a locomoção humana, o presidente anunciou a desoneração do setor automobilístico.
O desconto de impostos será pequeno. Um carro que vale R$ 70 mil terá um “desconto” de dez mil. O intuito, segundo o Governo, é proporcionar que o pobre compre carro, além de aquecer o setor e gerar empregos. Eu só consigo pensar em três coisas: trânsito caótico, poluição e endividamento dos pobres.
Por que não investir em transporte público de qualidade? Por que não anunciar medidas para o barateamento de carros elétricos? Por que não propor ações de ampliação da malha ferroviária nacional? O modelo que Lula propõe não resolve o problema e, a médio e longo prazos, transformará o Brasil no retrato de um país fracassado.
É bem verdade que, em viagens internacionais, o presidente conseguiu angariar alguns bilhões de reais, em tese, para a proteção da Amazônia. Mas, enquanto o governo bate cabeça na pauta ambiental, contrariando o discurso de campanha, o desmatamento da maior floresta do mundo, e do Cerrado, crescem mês após mês, segundo as fontes do próprio governo.
Parece que a grande conquista ambiental é a perda gradativa da soberania nacional nesse campo. Ganhamos o direito de que outros países ditem o que devemos fazer enquanto não fazemos nada. Puro estelionato [eleitoral] ambiental.
Agenda Política – Felipe Nunes